"Se continuar minha ponderação, penetrando um pouco mais no espaço difuso de Morangos silvestres, encontro no espírito da equipe que nele trabalhou, no esforço coletivo realizado, um caos negativo de relações humanas. O desquite da terceira esposa ainda me fazia sofrer muito. Foi uma experiência estranha aquela de amar alguém com quem não era possível viver. Também a vida em comum com Bibi Anderson, uma vida branda e criativa, havia começado a ruir, já não me recordo por que motivo. Com meus pais mantinha uma guerra aberta. Com meu pai não queria ou não podia falar, com minha mãe tentei repetidas vezes uma reconciliação temporária, mas, como dizemos em sueco, "havia demasiados cadáveres no guarda-roupa", demasiados mal-entendidos ainda frescos. Sem dúvida que nos esforçamos, pois queríamos, sim, fazer as pazes, mas os fracassos eram contínuos.
[...]
Procurava meu pai e minha mãe, mas não podia encontrá-los. A cena final de Morangos silvestres contém uma forte dose de saudade e nostalgia: Sara toma a mão de Isak Borg levando-o para uma clareira na floresta, na qual bate sol. Do outro lado do canal ele pode divisar seus pais, que lhe acenam.
Por toda essa história perpassa um só motivo, apresentado sob múltiplas e variadas formas: a insuficiência no jogo da vida, a pobreza, o vazio, a ausência de perdão. Ainda hoje não posso avaliar, e naquela altura muito menos, como eu, por meio de Morangos silvestres, estava implorando a meus pais: vejam, compreendam e, se possível, me perdoem."
(Ingmar Bergman em "Imagens")
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