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quarta-feira, 16 de julho de 2014

Bastidores: Monica e o Desejo



Enquanto preparava a realização de Quando as mulheres esperam, encontrei-me com regularidade com o escritor Per Anders Fogeltröm. Ele estava escrevendo um romance sobre dois jovens que fogem de suas casas e, juntos, vão viver um tempo no arquipélago, no seio da natureza, regressando depois à cidade. Escrevemos juntos um roteiro com base na história e, com um detalhado programa de como a produção seria feita, entregamos tudo à SF [Svensk Filmindustri]. Minha ideia era fazer um filme de baixo custo de produção, sob rigoroso princípio de simplicidade, longe de estúdios e com um número mínimo de técnicos. A realização de Monica e o desejo foi aprovada, sendo esse filme o segundo feito de acordo com o "contrato de escravo" que tinha com a SF. Para fazer o elenco com os atores Harriet Andersson e Lars Ekborg aproveitamos cenários de Sonhos de mulheres, quer dizer, mais uma vez interrompi um filme para trabalhar em outro.

Nunca fiz um filme tão simples como Monica e o desejo. A bem dizer, foi assim: partimos para o arquipélago e gravamos o filme. Aquela liberdade nos encantou. E o sucesso de bilheteria foi considerável. 



(Ingmar Bergman em "Imagens")

sábado, 12 de julho de 2014

Vento e Areia de Victor Sjostrom (the wind, 1928)


direção: Victor Sjostrom;
escrito por: Frances Marion, Dorothy Scarborough (baseado em seu livro);
fotografia: John Arnold;
edição: Conrad A. Nerving;
estrelando: Lillian Gish, Lars Hanson, Montagu Love, Dorothy Cumming.

Quando Bela Tarr lançou seu ultimo filme em 2011, O cavalo de Turim, o impacto do cinema do realizador húngaro se abateu com força sobre os espectadores que o desconheciam. Uma das características mais impressionantes de seu derradeiro filme foi o uso do som para captar o vento. O vento que perturba, oprime e, ao mesmo tempo, mostra que além daquelas paredes que cercam os personagens existe um mundo desconhecido. O vento é uma destas "entidades" fantásticas que podem ser utilizadas no cinema de forma magistral por seu caráter misterioso. Ele surge, nós o sentimos, vemos os efeitos que ele causa, mas não podemos enxergá-lo nem sabemos sua proveniência. E é por meio de uma representação dele que um cineasta atento pode abrir todo um mundo de discussões físicas e/ou metafísicas acerca do mundo que nos cerca. Outro caso que vale ser citado aqui é de Ingmar Bergman que em O sétimo selo conseguiu imprimir em película, o silêncio. É um embate muito característico a cineastas inquietos este de buscar representar em seus filmes (seja imageticamente, como no caso de Bergman, seja por meio do som, como no caso de Tarr) aquilo que seria pobremente captado no mundo.

Em Vento e areia, Victor Sjostrom - que outrora já havia conseguido a proeza de, por meio de sobreposições, fazer fantasmas passearem pelos cenários de A carruagem fantasma -  parte em busca de uma tarefa tão difícil quando a de seu citado clássico: filmar o vento. Tarefa aceita quando o diretor é contratado pelo estúdio MGM para ser um de seus cineastas. Caindo nas graças de Lillian Gish, Sjostrom consegue esta película que viria a se tornar um de seus maiores clássicos, contando uma história típica dos filmes que a atriz costumava fazer. Letty sai da Virginia para morar com o primo em um rancho. Durante a viagem de ida ao tal rancho o primeiro sinal do caos em que ela se encontrará já se apresenta a sua frente. Uma tempestade de areia encontra o trem que cruza o deserto e entra pela janela que Letty havia deixado aberta. É uma desculpa para que um homem com quem havia trocado olhares se aproxime e inicie uma conversa. Somente nesta primeira cena já estão entregues os dois elementos que mais atormentarão a protagonista.


Mas a real preocupação de Sjostrom não é a de filmar um drama, tão somente. Ele quer filmar também o embate do homem e da natureza que o cerca e da possível aceitação deste homem frente ao que a natureza lhe impõe. É o caso de Letty e o vento. O vento é constante, forçando a protagonista a se acostumar com ele ou se entregar a uma loucura já anunciada pelo estranho no trem. A jovem recém-chegada é a única que demonstra um estranhamento com o vento que não para. Todas as demais pessoas estão mais do que acostumadas a ele. Ninguém cambaleia devido ao vento ou se importa com a areia que ele leva para a comida. É um elemento natural que a natureza lhes impôs. Embora façam um paralelo entre o vento e um cavalo, quem é domado não é a natureza, mas o homem. É ele quem se acostuma e passa a viver obedecendo às suas regras (e a cena do ciclone não poderia ser mais simbólica).

E é por isso que a personagem que devemos seguir deve ser alguém que nunca antes havia tido este confronto, para quem a natureza era domável, não domadora. Quando não mais possui o controle do mundo em suas mãos, o chão de Letty passa a desaparecer e os primeiros sinais de loucura aparecerão. Não somente devido ao vento que a importuna, mas a cobrança da esposa de seu primo que a obriga a se casar para deixar sua casa. O mundo ao seu redor lhe impõe suas condições para que ela possa nele viver e ela tem que aceitar sem muito o que dizer. São nestes momentos de maior desespero que a direção de Sjostrom surge para pontuar as aparições deste vento que surge opressor, agredindo as paredes do casebre em que agora vive Letty, as janelas, batendo na porta e querendo entrar (e por vezes conseguindo). Não é por acaso que a redenção da personagem e sua rendição ao vento parta de seu marido, a única figura no filme que não lhe obriga a fazer coisa alguma. Ela sente na pele o que é ser o vento. 


A participação do vento marca o filme. Algumas de suas cenas magistrais demonstram o vigor da natureza e seu poder frente ao homem. Numa das cenas mais marcantes do filme temos a primeira noite de casada de Letty. Seu marido surge no cômodo principal do casebre com um café em mãos, se espanta ao ver pela primeira vez os cabelos soltos de sua esposa e vai até ela oferecer-lhe café. Nota, então, que ela não está contente com o matrimônio e hexita por um momento em agarrá-la a força. Sai do cômodo. Letty continua a pentear seus cabelos, de forma nervosa, caminhando de um lado para o outro. É aqui em que Sjostrom faz a famosa montagem "enquanto isso...", em que primeiro é mostrado a ação de um personagem e após o corte mostra o outro. Com esta montagem paralela em que são mostrados de forma simultânea (embora não apareçam juntos no quadro) os dois personagens, Sjostrom nos demonstra que não somente sua protagonista está apreensiva com o que fará o seu marido, como também ele está apreensivo sobre o que deverá fazer e o que será o seu casamento dali para frente. Numa amostragem de brilhante maestria, o diretor retira a câmera do rosto de seus personagens e passa a mostrar seus pés, afinal de contas são eles os membros que trabalham para demonstrar tal apreensão. Primeiro vemos os pés dele caminhando sobre o chão de madeira, e um corte para o vento que levanta a areia do deserto e a joga contra o casebre. A agressividade do vento contra o casebre é o que impulsiona a agressividade com a qual o marido de Letty irá agir logo em seguida.

Trata-se, portanto, de uma obra essencial para o entendimento do cinema, um filme dirigido por um mestre que conseguiu o que poderia soar impossível: mostrar o invisível. Os devidos créditos desta façanha devem ser dados ao seu diretor. Victor Sjostrom ao filmar o embate entre o homem e a natureza que o cerca não tomou partido por nenhum dos lados, preferindo conciliá-los.

[ps.: a cena do homem enterrado na areia e sendo desenterrado pelo vento é uma das razões pelas quais ver e rever este filme pelo resto da vida!]

domingo, 29 de junho de 2014

Bastidores: Morangos Silvestres



"Se continuar minha ponderação, penetrando um pouco mais no espaço difuso de Morangos silvestres, encontro no espírito da equipe que nele trabalhou, no esforço coletivo realizado, um caos negativo de relações humanas. O desquite da terceira esposa ainda me fazia sofrer muito. Foi uma experiência estranha aquela de amar alguém com quem não era possível viver. Também a vida em comum com Bibi Anderson, uma vida branda e criativa, havia começado a ruir, já não me recordo por que motivo. Com meus pais mantinha uma guerra aberta. Com meu pai não queria ou não podia falar, com minha mãe tentei repetidas vezes uma reconciliação temporária, mas, como dizemos em sueco, "havia demasiados cadáveres no guarda-roupa", demasiados mal-entendidos ainda frescos. Sem dúvida que nos esforçamos, pois queríamos, sim, fazer as pazes, mas os fracassos eram contínuos. 
[...]
Procurava meu pai e minha mãe, mas não podia encontrá-los. A cena final de Morangos silvestres contém uma forte dose de saudade e nostalgia: Sara toma a mão de Isak Borg levando-o para uma clareira na floresta, na qual bate sol. Do outro lado do canal ele pode divisar seus pais, que lhe acenam.
Por toda essa história perpassa um só motivo, apresentado sob múltiplas e variadas formas: a insuficiência no jogo da vida, a pobreza, o vazio, a ausência de perdão. Ainda hoje não posso avaliar, e naquela altura muito menos, como eu, por meio de Morangos silvestres, estava implorando a meus pais: vejam, compreendam e, se possível, me perdoem."



(Ingmar Bergman em "Imagens")

sábado, 22 de março de 2014

Noites de Circo de Ingmar Bergman (gycklarnas afton, 1953)


direção: Ingmar Bergman;
roteiro: Ingmar Bergman;
fotografia: Hilding Bladh, Sven Nykvist;
estrelando: Ake Gronberg, Harriet Andersson, Hasse Ekman.

Albert Johansson (Ake Gronberg) é proprietário de um circo. Ele sofre porque seu trabalho não é tão apreciado quanto ele acha que deveria ser e sonha com a América, terra das oportunidades, onde um proprietário de circo poderia ser rico, ao contrário de seu país, em que quem trabalha no circo não é visto com bons olhos. É em um país com uma formação mais erudita que Bergman coloca de modo sutil o embate dentro da arte: qual a diferença entre circo, teatro e cinema?

O circo vai de mal a pior. As instalações não são das mais confortáveis e o urso está morrendo. Albert não vê sua família há três anos, tendo arranjado uma amante muito mais jovem para si neste meio tempo e que o acompanha com o circo. Mas enfim o circo se instala na cidade em que sua família vive e finalmente ele poderá ver sua esposa e filhos novamente. A chegada é fria. Seus filhos são crianças e têm dificuldade para reconhecer o pai. A esposa também o recebe de maneira fria demonstrando com esta abordagem que não quer que ele fique em casa.


Na cidade existe um grande teatro onde Albert e Anne, sua amante (Harriet Andersson), aparecem para pedir à companhia, que lá está a ensaiar uma peça que em breve estrearão, algumas roupas emprestadas para poderem apresentar suas performances. É aqui em que surge o primeiro embate. O diretor da peça (Gunnar Bjornstrand) e aparente diretor da companhia, volta-se para o dono do circo e coloca que o teatro é uma forma superior de representação: o teatro é arte enquanto o circo é simples entretenimento. Ambos são modelos de arte, poderia ser a abordagem de Bergman para este filme, uma sendo mais popular que a outra, ou ao menos tendo maior apelo popular.

Quanto ao cinema: o filme inicia com uma cena um tanto estranha. Albert vai conversar com o cocheiro e lhe diz que não vê sua família há três anos. O cocheiro então conta-lhe uma história sobre a dificuldade de trabalhar num circo e ser casado. Na história, a mulher de um palhaço vai tomar banho de mar nua com diversos soldados que estão fazendo um treinamento com canhões à beira da praia. Uma pessoa vai contar ao palhaço o que está acontecendo e este vai até a praia acompanhado de toda a trupe do circo. Chegando lá ele tira a esposa da água e a carrega de volta, nua, para o circo. Esta história não será comentada em nenhum momento pelo resto do filme, mesmo tendo ocorrido com um palhaço da trupe de Albert (com a exceção de um breve comentário feito pelo próprio Albert, mas que nada influencia para o andamento no enredo). A cena tem momentos mudos, quase alcançando a atmosfera de um sonho.


Neste ponto temos três formas diferentes de expressão artística muito semelhantes. Uma delas é o circo, tomado como simples entretenimento e sem qualquer valor artístico. O segundo é o teatro, embebido de uma aura refinada. A terceira, que surge de forma mais sutil nesta história que abre o filme, é o cinema. O cinema pode criar formas diferentes, com seu trabalho feito com o tempo e espaço, desenvolvendo assim outros mundos, podendo servir para mostrar o lado subjetivo de quem estamos a acompanhar. Já o circo e o teatro são extremamente próximos, diferenciando-se somente pela forma como a comunidade artística os encara.

Anna passa a ter um caso com um ator do teatro que diz para Albert que dormiu com sua amante durante uma apresentação do circo. É nesta cena, uma das ultimas do filme, em que o embate entre as artes se resolve. Albert e o ator do teatro brigam no centro do picadeiro mostrando que ambas as performances são mais próximas do que ambos poderiam imaginar. Num teatro pode ser encenada uma comédia farsesca como é apresentada num circo e isso não diminuiria a sua aura de refinação. Por que então o circo não é tão bem visto?

quarta-feira, 6 de março de 2013

O Cinema em Cores

Se o cinema sonoro não evoluiu tanto (como coloquei em postagem recente), o cinema em cores foi bastante explorado. 

Não que o cinema colorido tenha causado uma grande revolução no cinema, como foi o caso do cinema sonoro. Na verdade não fez quase diferença nenhuma. Mas o modo de explorar as cores foi amplamente trabalhado e estudado. Pode-se, sim, dizer que, no caso do cinema em cores, a evolução foi maior do que a do cinema sonoro. As cores podem não ter feito parte de nenhum grande estudo, mas fazem parte de uma grande revolução na forma de pensar um filme. 

Um bom fotografo junto com um bom diretor irão sentar e pensar juntos nas cores do ambiente onde a história se passa. Dependendo das cores utilizadas, algo pode ser explorado no pensamento, em como aquela mensagem chegará ao espectador. As cores possuem diferentes impactos, e saber usá-las é um ponto a mais que o diretor ganha. Uma cena pode ficar mais impactante do que outras. 

Neste caso podemos lembrar de casos famosos. O primeiro, Psicose de Alfred Hitchcock. Neste filme de 1960, Hitchcock prefere utilizar o preto e branco por, além de ser melhor para os filmes de suspense, iria diminuir o impacto do sangue na famosa cena do chuveiro. O segundo caso também vai na mesma direção. Taxi Driver, de Martin Scorsese, teve a cena do tiroteio escurecida na pós-produção, também devido ao impacto que a cor do sangue exerceria na público. 

As cores dos cenários também servem para o mesmo intuito e quem ficar interessado pode ver o belíssimo "Gritos e Sussurros" de Ingmar Bergman, um verdadeiro estudo acerca da utilização das cores no cinema.


Na imagem "Gritos e Sussurros" de Ingmar Bergman.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Ingmar Bergman


É necessário falar de Bergman.
Na verdade, é necessário não se esquecer a genialidade de Ingmar Bergman.
Bergman foi, outrora, um dos maiores e mais prestigiados cineastas do mundo. 
Hoje, Ingmar Bergman é um dos maiores cineastas da história, mas que aos poucos está sendo esquecido.
Talvez falte um pouco de capacidade para falar sobre Bergman. Seu filmes não são fáceis, tanto o enredo quando na composição das imagens e da criação da narrativa cinematográfica.
Por isso publico esta postagem, seguido de um video de um curso sobre Bergman ministrado pelo professor Sergio Rizzo.