Em 28 de dezembro de 1895 era realizado, no porão de um café em Paris, pelos irmãos Auguste e Louis Lumière, a primeira exibição de um filme. Na verdade de um conjunto de filmes. Os famosos Irmãos Lumière eram donos de uma fábrica de celuloide para câmeras fotográficas, e foi partindo daí que os dois desenvolveram a máquina que viria a se tornar a marca do século XX, espantando e apaixonando pessoas de todo o mundo. Inicialmente, os Lumière tinham sua invenção como algo que serviria à ciência e não ao entretenimento. A invenção dos irmãos de Lyon chegaria em solo brasileiro seis meses depois, sendo que a primeira filmagem do Brasil apresentava a chegada do cinematógrafo da cidade de Rio de Janeiro (ao que tudo indica, esta gravação mítica está perdida).
Georges Meliès, ilusionista profissional, descobre a invenção dos Lumière e logo consegue uma para si. Seus objetivos são muito diferentes daqueles tidos pelos irmão inventores, uma vez que Meliès é um homem do espetáculo, do entretenimento; ele passa a utilizar a criação para contar histórias. Não muito tempo depois do surgimento do cinema, começam a surgir os primeiros estúdios de cinema. Certo dia, filmando uma rua com alguns de seus assistentes (de seu estúdio recém inaugurado), Meliès descobre a maravilha que pode ser proporcionada por um corte. Um de seus assistentes a filmar, para por um momento e, logo em seguida, retoma a gravação. Quando projetado, o filme apresentava um carro desaparecendo em frente à câmera (infelizmente, este é outro filme perdido).
Um mundo de fantasia extraordinário seria desenvolvido graças a este descuido de um dos operadores de câmera que trabalhavam ao lado de Meliès. A partir de uma técnica simples, a interrupção da filmagem e depois a retomada da gravação, o cineasta francês pôde contar as mais diversas histórias que não seriam possíveis de serem apresentadas em lugar algum além do cinema. Foi assim que Meliès apresentou ao mundo o diabo, que atormentando alguns jovenzinhos, se teletransportava, deixando apenas uma coluna de fumaça no lugar em que estava. Assim também ele pôde filmar os moradores da lua que, ao serem tocados, explodiam no ar.
O acaso também estava presente na vida dos irmãos criadores do cinema. Relutantes de início a fazer filmes como Meliès, os Lumière se contentavam em filmar cenas do cotidiano (esta visão dos Lumière seria mais tarde abraçada e teorizada por Dziga Vertov): os operários saindo da fábrica, o trem chegando à estação... e foi numa destas filmagens que outra técnica muito famosa nasceu: o travelling. Um assistente dos Lumière, ao filmar os casarões de Veneza em uma gondola desenvolveu aquele famoso movimento em que a câmera passeia pelo cenário saindo do lugar em que inicialmente estava. Mais tarde, os Lumière também passariam a gravar filmes de ficção.
Ao contrário do que normalmente é dito, a narrativa cinematográfica foi criada por Edwin Porter. Porter é o criador daquele que talvez seja o primeiro faroeste do cinema. Com a narrativa cinematográfica poderíamos contar uma história saindo de um cenário para outro, mantendo a continuidade da história. Exemplo disso é o filme em que um grupo de bombeiros chega a uma casa pegando fogo para resgatar as pessoas que ficaram presas à casa em chamas. O filme se estrutura da seguinte maneira: 1) é mostrado o fogo do lado de fora da casa; 2) o morador, dentro do quarto, se desespera quando vê que a casa está pegando fogo e desmaia; 3) os bombeiros chegam, abrem as torneiras, colocam uma escada em direção à uma janela no primeiro andar enquanto outros entram pela porta da frente; 4) um bombeiro entra no quarto em que o morador havia desmaiado, quebra a janela; 5) o bombeiro sai pela janela e desce as escadas com o morador desmaiado nos braços.
Todos estes quatro pioneiros não conseguiram prosperar no cinema. Meliès, por exemplo, teve que vender seus filmes para que fossem derretidos e virassem sola de sapato durante a I guerra mundial, já que seus filmes não mais lhe davam qualquer retorno financeiro. Os quatro morreram no esquecimento, sem dinheiro e sem reconhecimento. O reconhecimento lhes surgiu tardiamente, e hoje lhes é dado com o crescimento do estudo do cinema - que somente foi ser tido como disciplina na França na década de 1950, e aqui no Brasil em 1960.
Neste dia em que o cinema faz aniversário, pensar suas origens o faz mantê-lo vivo.
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